sexta-feira, 5 de agosto de 2011

O código dos artistas

Esta coisa da inspiração é uma grande treta! Todos os artistas dizem ter algum local de inspiração: o mar, os grilos, a brisa fresca da Primavera a bater-nos na cara, Paris e os seus becos iluminados... São todos locais, climas, cheiros, sentidos, estados de espírito ou meditações puramente belas, silenciosas e relaxantes.
Todos os artistas, ao sentir a delicadeza disso a que chamam inspiração, se lembram de alguma coisa para inventar, se enchem de cores, de risos e de sentidos e a arte aparece como que por magia. Como se um toque das coisas que mais adoram os despertasse para a vida!
Todos eles têm uma inspiração...
Todos menos eu. Eu só tenho pontos de referência. Isso, pontos de referência que apenas me fazem sorrir: O cheiro a barba feita do meu pai; O riso da minha mãe; A simplicidade única do meu irmão; O som da chuva a bater na janela; A música; A aldeia dos meus avós...
Quanto à inspiração, a malandra surge-me em todo o tipo de sítios estranhos: na hora de ir para a cama, no meio do barulho e das discussões, ao som das picaretas e maçaricos das obras da casa ao lado, até, às vezes, na casa de banho!
Portanto, fico-me pelos pontos de referência. Não posso chamar inspiração a sítios como a casa de banho! Ofenderia o código dos artistas, que para mim é uma das mais descaradas mentiras do mundo. Tudo o que tenho, tudo o que eles têm são pontos de referência. Mas nenhum deles, nenhum de nós o quer admitir.

Dedicado a todos os artistas principalmente ao meu tio e à minha vizinha, pintores; à minha tia e à minha mãe, escritoras; ao meu pai e ao meu irmão, músicos.

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