sábado, 12 de março de 2011

Descascador de batatas

Quando era ainda muito pequenina e inocente (como se isso fosse há muito tempo atrás!) perguntei ao meu pai o que queria ser se não fosse professor. O meu pai sorriu com um ar matreiro e respondeu: "Se não fosse professor, queria ser descascador de batatas num restaurante!"
E eu ri-me muito alto, porque mesmo pequenina e inocente sabia distinguir uma brincadeira de uma coisa séria. Mas agora, para dizer a verdade, penso que seria muito menos trabalhoso para o meu pai ser descascador de batatas no MacDonald's do que professor na escola ali da esquina. Quando se é descascador de batatas, existe um grande risco de cortarmos os nossos próprios dedos e de ficarmos com a mão cansada de fazermos sempre o mesmo movimento e até, com um bocado de azar, de ficarmos com um entorse na mão. No entanto, depois de muitos longos anos a descascar tubérculos de tamanho indefinido no MacDonald's, pode ser que evoluamos para descascadores de cebolas e passemos os dias a chorar até nos secarem as lágrimas. Depois, mais tarde, quando o dono do MacDonald's se reformar, talvez tenha pena do pobre coitado que passa o dia a chorar até secar as lágrimas e o promova a dono daquilo tudo. E, com sorte, talvez o desgraçado descascador de cebolas apareça no telejornal, ou num qualquer documentário sobre alguém que preferiu ser descascador a professor, e, ao contrário do que se esperava, se tornou num milionário respeitado por todos os fãs de hambúrgueres e outra qualquer comida de plástico.
Quando se é professor tem de se preparar aulas, fazer actas, ir a reuniões, ajustar o horário de modo a poder levar e ir buscar os filhos à escola, lidar com encarregados de educação que insistem no facto de o seu filho ser um santinho que não faz mal a uma mosca, transmitir más notícias, escrever recados, marcar faltas disciplinares e perder o intervalo por causa de um único miúdo cheio de dúvidas sobre a matéria, que para o professor não é assim tão difícil.
Ao menos dantes, segundo contam os meus pais, ser professor era divertido. Os alunos empenhavam-se, os horários não eram tão apertados, não havia tantas leis, decretos, artigos, ofícios, circulares,... e a matéria não parecia tão enfadonha. Mas, como dizem as pessoas mais velhas, esta juventude e este governo de agora já não são o que eram. Eu não sei nada do que digo, só digo o que ouço de outras pessoas, de pessoas mais velhas, mais experientes e com outra noção de liberdade.

Ao menos, quando descascamos batatas, ninguém se dá ao trabalho de nos chatear a cabeça.

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